VIAGEM DO PAPA FRANCISCO À TERRA SANTA
DISCURSO
CELEBRAÇÃO ECUMÊNICA NO SANTO SEPULCRO
Recordação dos 50 anos do abraço entre o Papa Paulo VI e o Patriarca Atenágonas
Domingo, 25 de maio de 2014
Nesta Basílica, para a qual todo o
cristão olha com profunda veneração, atinge o seu clímax a peregrinação
que estou a realizar juntamente com o meu amado irmão em Cristo, Sua
Santidade Bartolomeu. Realizamo-la seguindo os passos dos nossos
venerados antecessores, o Papa Paulo VI e o Patriarca Atenágoras, que,
com coragem e docilidade ao Espírito Santo, permitiram há cinquenta
anos, na Cidade Santa de Jerusalém, o histórico encontro entre o Bispo
de Roma e o Patriarca de Constantinopla.
Saúdo cordialmente a todos vós aqui presentes. De modo particular,
agradeço vivamente por ter tornado possível este momento a Sua Beatitude
Teófilo, que quis dirigir-me amáveis palavras de boas-vindas, bem como a
Sua Beatitude Nourhan Manoogian e ao Reverendo Padre Pierbattista
Pizzaballa.
É uma graça extraordinária estarmos aqui reunidos em oração. O Túmulo
vazio, aquele sepulcro novo situado num jardim, onde José de Arimateia
devotamente depusera o corpo de Jesus, é o lugar donde parte o anúncio
da Ressurreição: «Não tenhais medo! Sei que buscais Jesus, o
crucificado; não está aqui, pois ressuscitou, como tinha dito. Vinde,
vede o lugar onde jazia e ide depressa dizer aos seus discípulos: “Ele
ressuscitou dos mortos”» (Mt 28, 5-7).
Este anúncio, confirmado pelo testemunho daqueles a quem apareceu o
Senhor Ressuscitado, é o coração da mensagem cristã, transmitida
fielmente de geração em geração, como desde o início atesta o apóstolo
Paulo: «Transmiti-vos, em primeiro lugar, o que Eu próprio recebi:
Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras; foi sepultado
e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras» (1 Cor 15, 3-4).
É o fundamento da fé que nos une, graças à qual professamos
conjuntamente que Jesus Cristo, o Filho unigénito do Pai e nosso único
Senhor, «padeceu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado;
desceu à mansão dos mortos; ressuscitou ao terceiro dia» (Símbolo dos
Apóstolos). Cada um de nós, cada baptizado em Cristo, espiritualmente
ressuscitou deste sepulcro, porque, no Baptismo, todos fomos realmente
incorporados no Primogénito de toda a criação, sepultados juntamente com
Ele, para ressuscitar com Ele e poder caminhar numa vida nova (cf. Rm
6, 4).
Acolhamos a graça especial deste momento. Detenhamo-nos em devoto
recolhimento junto do sepulcro vazio, para redescobrir a grandeza da
nossa vocação cristã: somos homens e mulheres de ressurreição, não de
morte. Aprendamos, a partir deste lugar, a viver a nossa vida, as
angústias das nossas Igrejas e do mundo inteiro, à luz da manhã de
Páscoa.
Cada ferida, cada sofrimento, cada tribulação foram carregados sobre
os próprios ombros do Bom Pastor, que Se ofereceu a Si mesmo e, com o
seu sacrifício, abriu-nos a passagem para a vida eterna. As suas chagas
abertas são a passagem através da qual se derrama sobre o mundo a
torrente da sua misericórdia. Não nos deixemos roubar o fundamento da
nossa esperança! Não privemos o mundo do feliz anúncio da Ressurreição! E
não sejamos surdos ao forte apelo à unidade que ressoa, precisamente
deste lugar, nas palavras d’Aquele que, já Ressuscitado, chama a todos
nós «os meus irmãos» (cf. Mt 28, 10; Jo 20, 17).
Claro, não podemos negar as divisões que ainda existem entre nós,
discípulos de Jesus: este lugar sagrado faz-nos sentir o drama com maior
sofrimento. E no entanto, à distância de cinquenta anos do abraço
daqueles dois veneráveis Padres, reconhecemos com gratidão e renovada
admiração como foi possível, por impulso do Espírito Santo, realizar
passos verdadeiramente importantes rumo à unidade.
Estamos cientes de que ainda falta percorrer mais estrada para
alcançar aquela plenitude da comunhão que se possa exprimir também na
partilha da mesma Mesa eucarística, que ardentemente desejamos; mas as
divergências não devem assustar-nos e paralisar o nosso caminho. Devemos
acreditar que, assim como foi removida a pedra do sepulcro, assim
também poderão ser removidos todos os obstáculos que ainda impedem a
plena comunhão entre nós.
Será uma graça de ressurreição, que já hoje podemos pregustar. Cada
vez que pedimos perdão uns aos outros pelos pecados cometidos contra
outros cristãos e cada vez que temos a coragem de dar e receber este
perdão, fazemos experiência da ressurreição! Cada vez que, superados
velhos preconceitos, temos a coragem de promover novas relações
fraternas, confessamos que Cristo ressuscitou verdadeiramente!
Cada vez que pensamos o futuro da Igreja a partir da sua vocação à
unidade, brilha a luz da manhã de Páscoa! A este respeito, quero renovar
o desejo, já expresso pelos meus Antecessores, de manter um diálogo com
todos os irmãos em Cristo para se encontrar uma forma de exercício do
ministério próprio do Bispo de Roma, que, em conformidade com a sua
missão, se abra a uma nova situação e possa ser, no contexto actual, um
serviço de amor e de comunhão reconhecido por todos (cf. JOÃO PAULO II,
Enc. Ut unum sint, 95-96).
Enquanto como peregrinos fazemos uma pausa nestes Lugares santos, a
nossa recordação orante vai para a região inteira do Médio Oriente,
tantas vezes marcada, infelizmente, por violências e conflitos. E não
esquecemos, na nossa oração, muitos outros homens e mulheres que sofrem,
em várias partes do mundo, por causa da guerra, da pobreza, da fome;
bem como os inúmeros cristãos perseguidos pela sua fé no Senhor
Ressuscitado.
Quando cristãos de diferentes confissões se encontram a sofrer
juntos, uns ao lado dos outros, e a prestar ajuda uns aos outros com
caridade fraterna, realiza-se o ecumenismo do sofrimento, realiza-se o
ecumenismo do sangue, que possui uma eficácia particular não só para os
contextos onde o mesmo tem lugar, mas, em virtude da comunhão dos
santos, também para toda a Igreja.
Aquele que por ódio à fé matam, perseguem os cristãos, não importa se
são ortodoxos, católicos, são cristãos. O sangue cristão é o mesmo.
Santidade, amado Irmão, e vós todos, queridos irmãos, ponhamos de
parte as hesitações que herdámos do passado e abramos o nosso coração à
acção do Espírito Santo, o Espírito do Amor (cf. Rm 5, 5) e da Verdade
(cf. Jo 16, 13), para caminharmos, juntos e ágeis, rumo ao dia abençoado
da nossa reencontrada plena comunhão.
Neste caminho, sentimo-nos sustentados pela oração que o próprio
Jesus, nesta Cidade, na véspera da sua paixão, morte e ressurreição,
elevou ao Pai pelos seus discípulos e que humildemente não nos cansamos
de fazer nossa: «Que todos sejam um só (…), para que o mundo creia» (Jo
17, 21).
E quando a desunião nos faz pessimistas, pouco corajosos, sem
confiança, coloquemos todos sob o Manto da Mãe de Deus. Quando na alma
cristã existem turbulências cristãs, somente sob o Manto de Nossa
Senhora encontraremos paz. Que Ela nos ajude neste caminho.
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